A pesquisa revela que as desigualdades de gênero se manifestam de forma mais clara fora da sala de aula, especialmente durante as aulas de educação física, recreios e atividades do contraturno, quando o controle é mais flexível e as dinâmicas entre os estudantes ocorrem com maior espontaneidade.
“Nessas situações, é comum que os meninos dominem os espaços esportivos, como quadras e campos de futebol, enquanto as meninas são excluídas ou desencorajadas a participar”, relata o pesquisador. “Muitas vezes, quando tentam se inserir nesses ambientes, são retiradas sob a justificativa de evitar conflitos ou de que o esporte não é coisa de menina”.
Nos grupos focais realizados com os meninos, os pesquisadores mostraram cenas de violência no futebol entre jogadores dos times do Grêmio e do Internacional como disparadores para as discussões sobre violência e masculinidade. A reação dos meninos às imagens foi de comemorações efusivas diante de cenas de agressão. “Isto nos revela o quanto a estética da violência está naturalizada e associada à virilidade no imaginário masculino”, analisa Silva.
Nos grupos focais realizados com as meninas, os pesquisadores mostraram imagens de atletas mulheres para entender como são os acessos delas ao esporte e ao lazer. Elas reagiram negativamente às vestimentas, como biquínis no vôlei de praia, afirmando que trajes do tipo não poderiam ser usados em suas comunidades, o que revela como as meninas internalizam mecanismos de autoproteção e autocensura para evitar exposição a comentários ou assédios.
As jovens relataram que, em situações como tirar a camisa do uniforme para comemorar um gol — mesmo utilizando um top por baixo —, são imediatamente advertidas pelos professores. “Isso reforça o controle sobre seus corpos e comportamentos”, aponta o pesquisador.
No entanto, quando os meninos realizam a mesma ação, os responsáveis pela turma minimizam o comportamento, justificando que “eles são assim mesmo”.
O discurso dos professores corrobora esse cenário. Quando foram questionados, durante as entrevistas, sobre os episódios de violência protagonizados pelos meninos nas práticas esportivas, eles reconhecem essas atitudes como esperadas e atribuem a agressividade à competitividade. “Eles interpretam essas reações como inerentes ao universo masculino”, explica o pesquisador.
De acordo com os docentes, os estudantes costumam justificar as agressões afirmando que “o sangue subiu” – uma forma de explicar que perderam o controle.
Ainda nas entrevistas, os pesquisadores perguntaram a meninos e meninas sobre seus acessos a espaços públicos de lazer, questionando por exemplo, onde costumam brincar. As respostas dos estudantes mostram que os meninos circulam mais por esses espaços, até mesmo longe de casa. Já as meninas, em geral, ficam restritas aos arredores de onde moram e à escola. “Percebe-se uma tendência cultural de incentivar os meninos a ocuparem os espaços públicos, enquanto as meninas são direcionadas a permanecer em casa, voltadas para a vida privada”, explica Silva.