Mais autonomia na terceira idade

Pesquisadores de diferentes instituições se unem para identificar quem são, onde estão e quais as necessidades dos idosos que vivem sozinhos nas cidades de São Paulo, Santo André e Jundiaí

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Por Rodrigo de Oliveira Andrade

O Brasil está envelhecendo em um ritmo cada vez mais acelerado. Estima-se que indivíduos com 65 anos ou mais respondam por 10,9% da população — dos 203,1 milhões de brasileiros, 22,2 milhões estariam nessa faixa etária, segundo dados do Censo Demográfico 2022, divulgados em outubro pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Esse é o maior percentual de idosos desde que o primeiro rastreamento foi realizado no país, em 1872.

Muitos vivem sozinhos. De acordo com dados do estudo Saúde, Bem-Estar e Envelhecimento, realizado desde 1999 pela Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (FSP-USP), a capital paulista tinha 1,8 milhão de idosos em 2020, dos quais 350 mil viviam sozinhos, seja por escolha própria, perda do parceiro — por divórcio ou morte —, falta de recursos financeiros ou abandono e descaso de seus familiares.

Imagem: FREEPIK

O médico Nivaldo Carneiro Junior, da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo (FCMSCSP), quer compreender melhor a realidade de vida dos idosos que moram sozinhos. Ao lado de pesquisadores de outras instituições, ele e sua equipe estão trabalhando para identificar quem são, onde estão e quais são as necessidades desses indivíduos nas cidades de São Paulo, Santo André e Jundiaí, e as redes de atendimento social e de saúde que usam.

“Queremos saber o nível de renda e escolaridade, assim como os hábitos e as condições de vida desse grupo social para verificar o que os levou a morar sozinhos e quais são suas principais demandas”, afirma Carneiro Junior. “Morar sozinho não é ruim”, ele diz. “O problema é a falta de políticas que sustentem a autonomia dessas pessoas em suas casas.”

O envelhecimento traz consigo inúmeros desafios para aqueles que vivem sozinhos. Muitos idosos são portadores de doenças crônicas — as quais requerem acompanhamento e tratamento contínuos —, enfrentam dificuldade para acessar serviços de saúde e realizar tarefas básicas da vida cotidiana, não raro, sem ter ninguém com quem contar em caso de necessidade.

Para acessar a realidade de vida dessas pessoas, o grupo coordenado por Carneiro Junior está recolhendo dados iniciais de diversas pesquisas brasileiras, entre elas o Censo Demográfico 2022 e o Estudo Longitudinal da Saúde dos Idosos Brasileiros (ELSI), coordenado pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) em Minas Gerais. Nos próximos meses, eles também pretendem realizar entrevistas com idosos que vivem sozinhos para conhecer melhor suas trajetórias de vida, fragilidades, redes de apoio social e familiar, se têm acesso a serviços e bens públicos, suas condições de moradia etc.

O objetivo é identificar os determinantes estruturais e intermediários de vulnerabilidade dessas pessoas e usar esses dados para subsidiar o aprimoramento e o desenvolvimento de políticas públicas de proteção dessa população. “O envelhecimento populacional ainda é uma questão desafiadora para a agenda pública”, comenta o médico. “Há questões individuais e coletivas que precisam ser levadas em conta, de modo que é importante identificar as barreiras domiciliares, territoriais e de acessos aos serviços e espaços públicos enfrentadas pelos idosos que moram sozinhos.”

Carneiro Junior diz que importantes políticas públicas de atenção aos idosos foram implementadas nos últimos anos no âmbito nacional. Caso da Política Nacional do Idoso, do Estatuto da Pessoa Idosa, da Política Nacional de Saúde da Pessoa Idosa e da Rede de Atenção à Saúde da Pessoa Idosa, as quais levaram à criação de programas locais, como o Programa de Acompanhante de Idosos (PAI), lançado em 2007 na cidade de São Paulo com o objetivo de reabilitar e desenvolver o autocuidado e promover a socialização dos idosos, retardando a perda de sua capacidade funcional e, consequentemente, sua institucionalização.

As equipes do PAI são vinculadas a uma unidade básica de saúde e contam com 17 profissionais, incluindo um médico e dez acompanhantes, que realizam os atendimentos semanais. “É um serviço importante, mas ainda insuficiente”, afirma Carneiro Junior Atualmente, 50 equipes atendem apenas 6 mil pessoas na cidade, o que corresponde a 0,33% da população idosa em geral e 1,7% dos indivíduos com 65 anos ou mais que vivem sozinhos.

“Esperamos que os resultados do nosso estudo ajudem a pautar a agenda pública sobre a necessidade de políticas e programas voltados ao acompanhamento e cuidado de idosos que vivem sozinhos, difundindo o conhecimento sobre envelhecimento e políticas públicas no meio acadêmico e na sociedade em geral”, destaca o pesquisador. Outra expectativa é que os resultados colaborem para aprimorar a formação de profissionais em áreas relacionadas ao cuidado dessas pessoas, reduzindo as iniquidades sociais no acesso aos serviços públicos.

Sobre o projeto

O projeto Pessoas idosas que moram sozinhas: demandas para as políticas públicas foi contemplado na Chamada nº 40/2022, do Edital Pró-Humanidades do CNPq. 

Coordenador: Nivaldo Carneiro Junior (FCMSCSP)