Projeto promove inovação em ilha da Amazônia

Um portal de Ensino a Distância (EAD) com videoaulas e uma plataforma de streaming – que abriga vídeos produzidos a partir dos saberes locais – são novidades em uma comunidade ribeirinha remota da Amazônia. Mesmo com a falta de conectividade à internet.

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Por Washington Castilhos

Criar uma alternativa para que alunos de escolas das comunidades ribeirinhas da Amazônia possam continuar a estudar, mesmo em situações restritivas como a necessidade de isolamento social imposta por uma pandemia, ou a falta de conectividade à internet em locais sem infraestrutura. Essa foi a motivação para a criação do SANDRO – acrônimo para Serviço Autônomo de apoio à formação Não presencial Destinado à população Ribeirinha e retroalimentado por meio de contatos Oportunistas. 

“Durante a pandemia, as escolas dos centros urbanos conseguiram dar continuidade às aulas, mas os ribeirinhos da Amazônia perderam dois anos, por falta de conectividade”, explica Mauro Margalho, professor e pesquisador do Programa de Pós-Graduação em Administração da Universidade da Amazônia (UNAMA), e coordenador do projeto.

O dispositivo, alimentado por energia solar, simula o modus operandi da internet, e já beneficia cerca de 80 alunos de uma escola de ensino fundamental em uma das 15 ilhas da região de Abaetetuba, cidade ribeirinha a cerca de duas horas de barco de Belém.      

O protótipo está sendo utilizado no apoio à formação não presencial, por meio de videoaulas disponibilizadas em um sistema de Ensino a Distância (EAD) criado especialmente para o dispositivo, o qual pode ser alimentado tanto por conteúdo das instâncias oficiais – como as secretarias de educação – como da própria comunidade.

“Isso fomenta um modelo de ciência cidadã e permite que o conhecimento ribeirinho se propague para as próximas gerações”, afirma Margalho.

O equipamento também está sendo utilizado como uma plataforma de streaming – chamada de SANDRO Play –, na qual são armazenados conteúdos produzidos pela população local, de acordo com seus interesses e saberes. O vídeo mais acessado até agora trata do branqueamento caseiro do açaí, processo fundamental para eliminar possibilidades de riscos à saúde humana, tornando a polpa da fruta segura para a venda e o consumo, um tema de interesse dos pais de alunos, que vivem do ciclo produtivo do açaí. 

Visando uma maior aproximação com os alunos, um designer criou o layout da plataforma. “A proposta é ter uma interface parecida com a de streamings, para que as pessoas não sintam diferença, já que a usabilidade é bem parecida”, diz o pesquisador.

Com design e navegabilidade semelhantes aos das plataformas comerciais de streaming, falta saber o que torna possível o uso da tecnologia pelas comunidades, estando elas desconectadas da internet. O pesquisador explica que o projeto se ancora na comunicação baseada em contatos oportunistas. Nesse sistema, o sinal de wi-fi é levado de uma escola matriz, sediada na capital paraense, até chegar na área remota por barcos – uma forma de comunicação remota conhecida como “mula de dados”. O sinal é mantido por meio do dispositivo Raspberry Pi, um minicomputador portátil que permite a conexão de periféricos e outros dispositivos.

O software permite o sincronismo por meio do wi-fi, levando o sinal da cidade de Abaetetuba até a escola ribeirinha, distante cerca de 30 minutos de barco.

“Quem está dentro da área de cobertura pode se comunicar. Nossa ideia é colocar um equipamento em cada uma das ilhas”, conta o pesquisador.

Foto cedida pelo coordenador do projeto

Por ora, por meio da parceria com as Universidades do Porto, em Portugal, do Tocantins (UFT), e a Federal do Pará (UFPA), os pesquisadores da UNAMA pretendem instalar um outro protótipo no parque ambiental do Utinga, em Belém.

Para abrigar o equipamento na comunidade do Pirocaba, onde o projeto piloto está sendo realizado, os pesquisadores simularam um poço, no qual há um QR code que facilita o acesso dos alunos via telefones celulares e tablets. A ideia é inspirada em uma lenda local, segundo a qual as moças, ao atingir a maioridade, faziam um desejo perto de um poço.

No parque da capital, a proposta é instalar um robô. “Ambas são ideias de antropomorfismo, para criar uma aproximação com a vivência e a cultura das comunidades”, explica Margalho.

Os pesquisadores querem treinar a comunidade para que as pessoas consigam disponibilizar conteúdos audiovisuais – como documentários sobre a questão ambiental ou filmes curtas-metragens produzidos pelos alunos – que possam “ficar em cartaz” na plataforma.

A iniciativa também conta com a parceria com o MORIVA – Movimento dos Ribeirinhos das Ilhas de Abaetetuba. Mais informações podem ser obtidas no site do projeto.

Sobre o projeto:

O projeto “Inovação tecnológica e inovação em comunidades ribeirinhas: contribuições à concepção de cidades inteligentes na Amazônia” foi contemplado na chamada nº 40/2022 do Edital Pró-humanidades do CNPq.

Coordenador: Mauro Margalho Coutinho (UNAMA)