Trajetórias pessoais na escrita dramática

Contexto cultural e condições sociais influenciam no interesse pela produção textual de jovens participantes em oficinas de escrita. Por outro lado, referências da trajetória pessoal estimulam tal interesse em pessoas da terceira idade, indica estudo da UFSC.

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Por Aline Weschenfelder

Investigadores apontam para uma certa resistência à prática da escrita por parte de jovens que estão participando de oficinas de produção de textos dramáticos, direcionadas a moradores de comunidades e a integrantes de instituições ligadas a movimentos sociais, como o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Os dados são alusivos aos primeiros cinco meses de uma pesquisa – em desenvolvimento no Núcleo de Estudos em Encenação e Escrita Dramática (NEEDRAM) da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) – que tem como objetivo incentivar adolescentes e adultos de diferentes faixas etárias e grupos sociais a expressarem seus sentimentos e interesses por meio da escrita dramática.

Para Paulo Ricardo Berton, pesquisador no Departamento de Artes da UFSC e coordenador do projeto, as dificuldades enfrentadas pelos participantes mais jovens se justificam em razão do contexto social a que pertencem. Segundo ele, trata-se de “uma geração tecnológica, baseada na imagem e muito ligada ao universo virtual”. 

De acordo com o pesquisador, interesses culturais também influenciam nas escolhas desses jovens, que acabam se afastando da atividade por darem preferência a outras formas de expressão, como a composição de músicas no estilo rap ou a produção de conteúdo para redes sociais.

Ao mesmo tempo, o estudo tem apontado que, para aqueles que persistem, o convívio no universo da literatura dramática reduz a dificuldade com a escrita. A produção de roteiros para teatro tem despertado nesses jovens o interesse em narrar suas experiências, descobertas afetivas e mesmo sobre os efeitos das redes sociais em suas vidas. Isso se explica porque os temas para a elaboração dos textos são definidos pelos próprios participantes e discutidos em grupo.

Por outro lado, segundo a pesquisa, pessoas da terceira idade são as que mais demonstram comprometimento com a iniciativa. “A arte da escrita está mais presente no contexto dessas pessoas”, avalia Berton.

“Embora seja um público leigo em relação à escrita dramatúrgica, alguns participantes mais velhos trazem referências de sua trajetória intelectual ou cultural, e têm muitas histórias para contar”, explica o pesquisador.

Entre os assuntos levantados pelos mais velhos estão questões sociais, raciais e de gênero. “É muito interessante ver pessoas de uma faixa etária mais elevada que, geralmente, parecem ter um pensamento mais conservador, mostrarem o contrário”, revela.

O número de participantes varia de cinco a dez pessoas em cada oficina e são propostos exercícios que incluem técnicas sobre a estrutura do texto dramático, criação de personagens, a importância de compreender o tempo e o espaço dentro de uma narrativa, e outros elementos necessários para compor um enredo cênico.

O coordenador do projeto também enfatiza a importância do envolvimento de alunos do curso de graduação em Artes Cênicas da UFSC no projeto, devido ao contato que eles passam a ter com contextos sociais diferentes daqueles em que vivem. Esses alunos, todos bolsistas de Iniciação Científica, acompanham os pesquisadores nos diferentes lugares em que as oficinas são realizadas, inclusive na área rural. “Geralmente eles não têm contato com a periferia de uma cidade grande, com idosos ou com a realidade do campo”, esclarece.

Para a fase final do projeto, está prevista a seleção de alguns textos escritos pelos participantes das oficinas para serem interpretados por atores e atrizes na forma de leitura dramática, em que não há figurino ou cenário, mas uma apresentação teatral verbalizada. A ação deverá ocorrer no âmbito dos cursos de Artes Cênicas de instituições parceiras do projeto, como a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), a Escola Superior de Arte Célia Helena, em São Paulo, e a Universidade de Brasília (UnB).

Duas oficinas estão acontecendo em Florianópolis, uma no Núcleo de Estudos da Terceira Idade (NETI), da UFSC, e outra na Associação Nipocatarinense, além de mais quatro em curso nos assentamentos do MST, no interior do estado.

Imagens: Freepik

Sobre o projeto:

O projeto “Esse é o meu Drama: o aprendizado da Escrita Dramática como ferramenta de expressão e reflexão de sujeitos e comunidades”, foi contemplado na Chamada nº 40/2022, do Edital Pró-Humanidades do CNPq.

Coordenador(a): Paulo Ricardo Berton