Por Aline Weschenfelder
Para entender os fatores que influenciam as percepções dos brasileiros sobre as mudanças climáticas, pesquisadores do Instituto Nacional de Comunicação Pública da Ciência e Tecnologia (INCT-CPCT/Fiocruz) entrevistaram 2.069 homens e mulheres com 16 anos ou mais de todas as regiões do país – considerando variáveis sociodemográficas como gênero, idade, religião, escolaridade e renda – e descobriram que 90% dos brasileiros acreditam nas mudanças climáticas.
De acordo com o estudo, realizado entre agosto e outubro de 2022, 86% acreditam que elas são causadas por ação humana, enquanto 12% sustentam que o fenômeno acontece por mudanças naturais do clima — uma fração preocupante, segundo os autores.
Os pesquisadores verificaram que o grau de escolaridade tem um efeito importante: 93% das pessoas entrevistadas com ensino superior e 87% das que têm ensino fundamental acreditam que as mudanças climáticas existem e que é um problema real, independentemente da faixa etária e do gênero. Aqueles mais informados ou favoráveis à paridade de gênero, à justiça social e à melhor distribuição de renda também são menos negacionistas.
“Nosso estudo indica a importância de algumas variáveis sociodemográficas para a formação de opiniões sobre o tema, especialmente renda e escolaridade, assim como a relevância do conhecimento e da familiaridade com noções de ciência. No entanto, letramento científico e acesso à informação explicam uma parte das atitudes, mas não contam toda a história”, afirmam os autores em artigo publicado na revista Mídia e Cotidiano, em setembro de 2024.
Outros fatores também influem no fenômeno, incluindo atitudes negacionistas como a hesitação vacinal. Entre as pessoas que dizem vacinar os filhos, 4% não acreditam nas transformações que o clima vem sofrendo em decorrência das ações humanas. Esse índice salta para 18% entre os anti-vacinas. Os pesquisadores constataram que fatores como a visão de mundo, a ideologia política e as experiências de vida das pessoas são igualmente relevantes para determinar a aceitação ou rejeição das mudanças climáticas.
Além disso, outro ponto é a confiança na ciência. “As pessoas que não confiam ou que dizem confiar menos nos cientistas são aquelas que têm mais chances de não acreditar na mudança climática”, diz Yurij Castelfranchi, professor associado do Departamento de Sociologia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e coordenador do estudo.
Os autores concluem que a comunicação sobre mudanças climáticas precisa ser elaborada com mensagens capazes de dialogar com diferentes públicos, considerando suas dimensões políticas e de valores morais, sejam eles conservadores ou progressistas, e que não basta passar dados científicos à população como um todo.
Castelfranchi ressalta que a divulgação científica não funciona igualmente para todo mundo, uma vez que muitas pessoas têm uma relação mais forte com valores políticos e morais do que com a alfabetização científica. “Nosso estudo deixa claro que alguns indivíduos são mais vulneráveis à desinformação climática não porque não têm acesso à informação, mas porque associam o tema das mudanças climáticas a posições políticas com as quais eles discordam”, conclui o sociólogo.
A professora e pesquisadora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) Eloisa Beling Loose, que não participou do estudo, concorda que a comunicação sobre mudanças climáticas demanda um diálogo com diferentes públicos, “para que estes sejam capazes de compreender o que é uma informação apurada e o que é mera especulação ou opinião”, diz.
Suas análises na área de comunicação e meio ambiente, com ênfase em mudanças climáticas, sugerem que apesar do empenho de diferentes coletivos e setores da sociedade – como cientistas e comunicadores – atestando a existência das mudanças climáticas e promovendo medidas para reduzir seus efeitos, há grupos que insistem em enfatizar que isso é um exagero.
Segundo Loose, são estratégias de grupos financiados por atividades responsáveis pelas emissões de gases de efeito estufa e, mesmo quando confirmam a existência das mudanças climáticas, atribuem a responsabilidade de encontrar uma solução à ciência e à tecnologia. Ela alega que o negacionismo ambiental e climático está relacionado a interesses políticos e econômicos. “O nosso modelo de desenvolvimento é atrelado ao crescimento do PIB, que, no caso brasileiro, é dependente da superexploração da natureza”, diz.
Para Loose, além de uma comunicação mais abrangente e eficaz, como apregoam os pesquisadores do INCT, é necessário haver mais transparência e responsabilização acerca da disseminação de conteúdos enganosos. Para a pesquisadora, se faz urgente uma regulamentação das plataformas digitais.
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