Tecnologia compromete o acesso à assistência social

Populações vulneráveis enfrentam dificuldades para acessar benefícios de assistência e previdência social após a informatização desses serviços, destaca estudo.

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Por Aline Weschenfelder

A informatização dos serviços de assistência e previdência social acabou por dificultar o acesso a esses atendimentos pelas populações em situação de vulnerabilidade, uma vez que grande parte dos usuários mais necessitados não têm computador ou celular para acessá-los, ou familiaridade com o uso desses equipamentos.

A conclusão é de pesquisadores das universidades federais do Rio de Janeiro (UFRJ), Santa Catarina (UFSC) e Alagoas (UFAL), que integram o grupo de pesquisas TIC (Tecnologias da Informação e Comunicação) em Políticas Sociais: desafios do acesso e intervenções profissionais. Segundo eles, tais dificuldades ajudaram a criar um mercado agenciador, no qual os usuários, sobretudo idosos, pagam outras pessoas para ingressar nos serviços em nome deles, aumentando o risco de golpes.

Esses achados resultaram em um novo estudo, em desenvolvimento no Programa de Pós-graduação em Serviço Social da UFRJ, que visa analisar como os usuários do Instituto Nacional de Seguro Social (INSS) e de Centros de Referência de Assistência Social (CRAS) acessam suas plataformas e como os profissionais da assistência social fazem a gestão e a operacionalização de seu trabalho por meio dessas tecnologias.

Imagem: freepik

A assistente social Yolanda Aparecida Demetrio Guerra, coordenadora do projeto, explica que a digitalização desses serviços tende a ser vista apenas pelos seus aspectos favoráveis. “Também é preciso discutir as dificuldades e os limites que a tecnologia impõe a profissionais e usuários desse sistema”, comenta.

Segundo ela, a pandemia deu mais visibilidade à digitalização dos sistemas de políticas sociais — como é o caso do INSS e dos CRAS —, e também à exclusão gerada por eles. “Foi nesse momento que começamos a observar as dificuldades de acesso por parte dos usuários ao auxílio emergencial, com filas de pessoas em busca de ajuda”, comenta a pesquisadora, referindo-se ao benefício criado em 2020 para garantir renda mínima aos brasileiros em situação de vulnerabilidade socioeconômica na pandemia.

“Mesmo tendo um celular, as pessoas tinham dificuldade para manuseá-lo e acessar os serviços”, diz Guerra. Entre as limitações identificadas estão a idade avançada, o analfabetismo funcional e total, e a falta de acesso à internet ou a dispositivos eletrônicos necessários para acessar as plataformas dos serviços sociais. Estudo do grupo de pesquisas TIC indica que 29 milhões de brasileiros não tinham acesso à internet em 2023. 

Além dos dados obtidos até aqui, o grupo entrevistará usuários e profissionais que atuam no INSS e nos CRAS do Rio de Janeiro, de Florianópolis e de Maceió. “Pretendemos aprofundar as informações sobre os impactos da implantação das plataformas digitais nesses serviços”, explica.

Eles também pretendem fornecer elementos para subsidiar políticas sociais voltadas à qualificação do exercício profissional e de usabilidade dos sistemas de informação relacionados aos serviços de assistência social. “Queremos levar essas questões aos órgãos competentes e ampliar o conhecimento sobre o tema, além de divulgá-las à sociedade, que merece ter acesso a essas informações”, conclui Guerra.

Sobre o projeto:

O projeto “Os desafios do acesso e das intervenções profissionais nas políticas sociais diante das Tecnologias de Informação e de Comunicação (TIC)” foi contemplado na chamada nº 40/2022, do Edital Pró-Humanidades do CNPq.

Coordenadora: Yolanda Aparecida Demetrio Guerra (UFRJ)