Cidadãos ajudam cientistas a prevenir acidentes no litoral nordestino

Iniciativa de ciência cidadã CoastSnap NE consolida-se como metodologia de baixo custo para o monitoramento da dinâmica das marés, variação da largura das praias e do risco de desabamento de falésias.

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Por Rodrigo de Oliveira Andrade

Coordenado por pesquisadores da Universidade Estadual do Ceará (UECE) e inspirado em uma metodologia criada na Universidade de Nova Gales do Sul, na Austrália, o projeto CoastSnap NE consolidou-se como uma metodologia de baixo custo e fácil aplicação para o monitoramento das zonas costeiras no Nordeste. A iniciativa tem usado fotos tiradas por voluntários para rastrear mudanças na costa provocadas por tempestades, aumento do nível do mar, atividades humanas, entre outros processos.

Esse modelo de colaboração, conhecido como ciência cidadã, tem como objetivo envolver indivíduos sem experiência científica na produção de conhecimento por meio de colaborações com cientistas. No caso do CoastSnap NE, os pesquisadores instalaram estações de monitoramento em várias praias com informações sobre como os voluntários podem participar da iniciativa, a importância das fotos para o monitoramento dos processos costeiros, de que maneira as imagens serão usadas e como podem ser enviadas. 

Segundo o geógrafo Davis Pereira de Paula, pesquisador do Centro de Ciências e Tecnologia da UECE e coordenador do CoastSnap NE, os resultados do monitoramento costeiro feito nas praias que integram o projeto indicam uma colaboração bem-sucedida entre voluntários e pesquisadores. “Já recebemos quase 2,2 mil fotos desde o início do projeto. Ou seja, 2,2 mil pessoas se engajaram conosco como cidadãos cientistas”, afirma.

As estações contam com um suporte fixo para que os voluntários posicionem seus smartphones na horizontal, fazendo com que as imagens sejam feitas sempre do mesmo local e com o mesmo ângulo, dando origem a um registro da posição do litoral em diferentes condições de maré em diferentes épocas do ano.

FOTO: CoastSnap NE
FOTO: CoastSnap NE

As fotos vão para um banco de imagens, onde são submetidas a softwares de georreferenciamento, que analisam os elementos nas imagens e os comparam com outras fotos da mesma paisagem, tiradas em momentos distintos. Em Caucaia, a cerca de 20 quilômetros de Fortaleza, os pesquisadores conseguiram identificar processos erosivos, rachaduras e sinais de quedas de rochas nas falésias que cercam a praia do Pacheco. A partir disso, puderam determinar as áreas de maior risco de desabamento de rochas. 

“Nos articulamos com a Secretaria Municipal de Meio Ambiente e lhes encaminhamos algumas informações em um relatório técnico indicando a necessidade de sinalização logo nas entradas de acesso à praia, com as áreas de risco, o que foi feito”, conta Davis. A ideia, segundo ele, é prevenir acidentes como o ocorrido em 2020 no Rio Grande do Norte, quando o desabamento de uma falésia na praia de Pipa, um dos principais destinos turísticos do estado, causou a morte de três pessoas de uma mesma família. Em 2022, outro desabamento aconteceu na região, desta vez sem vítimas.

Os pesquisadores também estão usando fotos de voluntários para monitorar uma barra arenosa na Praia do Retiro Grande, no município de Icapuí, também no Ceará, que serve como porto natural para uma comunidade pesqueira tradicional durante os períodos de maré alta. Quando a água recua, a barra se fecha e os barcos não conseguem sair. Da mesma forma, se ela se movimenta em decorrência de algum fenômeno climático ou geológico, pode afetar a pesca na região. “As fotos dos voluntários estão nos ajudando a monitorar o comportamento dessa barra, permitindo-nos obter informações sobre sua dinâmica de movimentação, o que será repassado para os pescadores para que possam se organizar e estabelecer os melhores momentos para sair com seus barcos para a pesca.”

Desde o início do projeto, os pesquisadores instalaram duas estações no Ceará (nas praias da Taíba e de Retiro Grande) e outras duas no Piauí (nas praias do Coqueiro e da Pedra do Sal). Eles agora se preparam para expandir suas bases para mais praias do nordeste. A expectativa é instalar mais três bases no Ceará, uma no Piauí e duas no Rio Grande do Norte, praticamente dobrando a capacidade de monitoramento do sistema.

Sobre o projeto

O projeto “CoastSnap NE — Monitoramento e Gestão territorial participativa da linha de costa” foi contemplado na chamada nº 40/2022, do Edital Pró-Humanidades do CNPq.

Coordenador: Davis Pereira de Paula (UECE)