Trajetória profissional de Josephina Albano é objeto de estudo

Objetivo é destacar suas contribuições para a consolidação da assistência social no Brasil e seu legado na formulação de políticas habitacionais

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Por Rodrigo de Oliveira Andrade

A trajetória profissional de Maria Josephina Rabello Albano (1916-1995) e seu papel na institucionalização do serviço social no Brasil estão sendo resgatados por um grupo de pesquisadores a partir da compilação e catalogação de dados inéditos de seu arquivo pessoal no Departamento de Serviço Social da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), instituição onde se formou e desenvolveu grande parte da sua carreira docente.

Josephina Albano teve papel importante no desenvolvimento e na profissionalização do serviço social no Rio de Janeiro e também no Brasil a partir da década de 1940. Sua influência, no entanto, vai além das fronteiras nacionais, estendendo-se para outros países da América Latina, onde desempenhou funções proeminentes em instituições como as organizações dos Estados Americanos (OEA) e das Nações Unidas (ONU), além do Centro Interamericano para a Habitação (CINVA), em Bogotá, Colômbia.

Por meio da digitalização de fotos, notícias de jornais, diplomas e certificados, relatórios, artigos, cursos e seminários que deu ao longo de sua carreira, entre outros documentos, os pesquisadores querem ampliar os estudos sobre a consolidação do serviço social enquanto profissão, na perspectiva da habitação e das políticas urbanas. “O resgate da trajetória e das contribuições de Josephina Albano nos permite compreender como a habitação se tornou um campo de trabalho e reflexão acadêmica dentro do serviço social”, destaca o filósofo Rafael Soares Gonçalves, do Departamento de Serviço Social da PUC-Rio, coordenador do projeto. Segundo ele, o acervo deverá ser disponibilizado em um arquivo digital gratuito até o final de 2024.

Josephina Albano nasceu em Fortaleza, no Ceará, em 31 de janeiro de 1916; mudou-se com os pais para o Rio de Janeiro em 1924. Anos mais tarde, em março de 1937, ingressou no curso superior de história e geografia na Universidade do Brasil, atual Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), mas não pensava em trabalhar como professora. “Ela cogitou ingressar em um curso de enfermagem, mas ficou sabendo da abertura de um novo curso universitário de serviço social na cidade”, conta Gonçalves.

Sem abandonar o curso de história e geografia, ingressou, em julho de 1937, na Escola de Serviço Social do recém-criado Instituto de Educação Familiar e Social, atual Departamento de Serviço Social da PUC-Rio. “A Igreja Católica foi muito atuante na origem da profissão, estando também diretamente envolvida na fundação do curso na PUC de São Paulo, em 1936”, explica Gonçalves.

Foto: Rafael Soares Gonçalves

Maria Josephina se formou na primeira turma do curso de serviço social, em 1940, mesmo ano em que concluiu o curso de história e geografia. Apesar de ter feito grande parte de sua carreira na área de políticas urbanas e habitacionais, sua primeira experiência de estágio se deu no Juizado de Menores, vinculado ao Ministério da Justiça, em 1939.

Em 1940, quando ainda estudava inglês no Instituto Brasil Estados Unidos (IBEU), soube de uma bolsa de estudos para serviço social na New York School of Social Work — primeira escola de serviço social, fundada em 1889 —, na Universidade de Columbia. O contexto era o da Política da Boa Vizinhança dos Estados Unidos, durante a qual o presidente Franklin Roosevelt (1882-1945) designou Nelson Rockefeller (1908-1979) como coordenador do recém-criado Office of Inter-American Affairs. Uma das funções do organismo era promover o intercâmbio científico, oferecendo bolsas de estudos nos Estados Unidos.

Josephina Albano conseguiu a bolsa e se mudou para os Estados Unidos em 1941 para cursar o mestrado na New York School of Social Work. Lá, fez estágios junto às populações imigrantes, como os porto-riquenhos e outros grupos que recebiam assistência pública, conheceu a teoria e a prática profissional do serviço social nos Estados Unidos, e tornou-se a primeira assistente social brasileira a estudar e obter o título de mestre naquele país, em dezembro de 1942.

A formação que recebeu nos Estados Unidos influenciou sua prática profissional e docente. “É na reunião dessas duas esferas que ela irá desenvolver seu trabalho, estabelecendo-se como uma referência internacional à medida que questões urbanas, habitacionais e sobre a pobreza se institucionalizam em congressos e nos objetivos propostos por instituições pan-americanas e multinacionais, incluindo a OEA e a ONU”, destaca o pesquisador.

Josephina Albano voltou ao Brasil em janeiro de 1943 para trabalhar na Legião Brasileira de Assistência (LBA) até 1947, quando foi convidada para trabalhar na ONU como assessora do governo de Filipinas na formação e treinamento de pessoal para organizar programas de bem-estar social, pesquisa social e supervisão de programas sociais no contexto de reconsrução daquele país no pós-guerra. 

Essa foi somente a primeira de várias experiências profissionais em órgãos internacionais para consultoria, gestão ou formulação de políticas públicas. Segundo reportagem publicada no jornal Tribuna da Imprensa em 23 de setembro de 1952, a assistente social foi nomeada chefe da seção de Serviço Social da divisão de Assuntos Sociais e do Tabalho da União Pan-Americana, atual OEA, em Washington, em dezembro de 1959, tornado-se responsável pela mobilização de recursos sociais, organização de centros sociais, supervisão e organização de programas de treinamento de pessoal.

Na OEA, foi assessora técnica de vários programas de bem-estar na América Latina e também participou de atividades junto ao Centro Interamericano para a Habitação (CINVA), criado em 1951 e inaugurado no ano seguinte em Bogotá, nas instalações da Universidade Nacional da Colômbia (UNAL), em parceria com o Instituto de Crédito Territorial (ICT). A iniciativa teve por objetivo a capacitação e formação técnica de profissionais e comunidades nos aspectos econômicos, sociais, culturais, administrativos, normativos, espaciais, construtivos, comunitários e sobre a habitação social e o planejamento urbano. “Ela procurou estabelecer relações interinstitucionais com outros países pan-americanos no esforço de propor soluções para os problemas da habitação social na América Latina”, conta Gonçalves.

Nesse contexto, publica o manual El factor humano en los programas de rehabilitación de tugurios (O Fator Humano nos programas de reabilitação de favelas, em português), no qual cita projetos e programas de vários países, compilando diferentes ideias sobre políticas habitacionais que vinham ganhando força nesse momento no continente. “Nossa ideia, ao resgatar a história e as contribuições de Josephina Albano, é avaliar a importância da área da habitação na formulação e aplicação de políticas de moradia mais justas e coerentes com as demandas e necessidades da população, e de que maneira elas evoluíram ao longo do tempo no Brasil”, finaliza o coordenador do projeto.

Sobre o projeto

O projeto “Habitação e Trabalho Social na América Latina” foi aprovado na chamada nº 40/2022 do Edital Pró-Humanidades do CNPq.

Coordenador: Rafael Soares Gonçalves (PUC-Rio)

 

Foto da capa: Acervo de Josephina Albano no Departamento de Serviço Social da PUC-Rio