Literatura, Cinema e Autoria de Mulheres no Brasil da Ditadura Militar

Coordenadora: Renata Soares Junqueira (UNESP)

Mulheres atuaram intensa e sistematicamente na criação e na expansão do moderno cinema brasileiro, e não só como atrizes. Foram continuístas, roteiristas, diretoras e produtoras, mas os diversificados frutos do seu trabalho criativo têm sido até hoje apagados ou relegados a segundo plano pelo domínio do cinema feito por homens. Investigar e questionar as razões dessa invisibilidade é tarefa urgente, uma vez que estudos recentes têm apontado para a qualidade do moderno cinema brasileiro de autoria feminina produzido nas décadas de 1960, 70 e 80, o qual absolutamente nada deve ao dominante: em termos de procedimentos formais, como veremos, o modo de composição que prevalece é também, com poucas exceções, o disjuntivo, não-mimético, autorreflexivo; e no que concerne à temática, as bandeiras que principalmente se levantam são a do feminismo e a da liberdade sexual, temerárias em tempos de truculenta ditadura militar (1964-1985). Para aquilatar esse cinema, estabelecemos um corpus constituído por um longa-metragem de ficção de cada uma de seis mulheres autoras com produção significativa no Brasil das décadas de 1970 e 1980: Os homens que eu tive (1973), de Tereza Trautman; Marcados para viver (1976), de Maria do Rosário Nascimento e Silva; Feminino plural (1976), de Vera de Figueiredo; Das tripas coração (1982), de Ana Carolina; Amor maldito (1984), de Adélia Sampaio. O sexto filme constitui uma justificável exceção: dirigido por um homem, John Herbert, foi, entretanto, roteirizado por Cassandra Rios, autora do romance A paranoica (1952), do qual a película é uma adaptação. Cassandra, como se sabe, foi recordista de vetos da censura ditatorial como autora prolífica de romances eróticos best sellers, teve quatro desses romances adaptados para o cinema e assumiu a autoria do roteiro fílmico de dois deles. Ariella (1980), o filme, também entra, pois, no campo da autoria feminina. A hipótese que trataremos de verificar é a de que não apenas o teatro épico de Brecht – que tanto motivou Glauber Rocha e outros cineastas brasileiros modernos –, mas também a literatura e as artes inspiradas pelas vanguardas históricas europeias, principalmente as que marcaram o modernismo brasileiro desde a Semana de Arte Moderna de 1922, exerceram sobre essas mulheres de cinema e suas obras uma influência bastante sensível.

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